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CPI: a quem interessa?

  • há 5 dias
  • 3 min de leitura
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Congresso se movimenta para instaurar CPI discutindo as negativas dos planos de saúde


A recente movimentação no Senado Federal para a instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) destinada a investigar as operadoras de planos de saúde ganhou novo capítulo. Conforme noticiado pelo Capital News, a senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) já conseguiu reunir 12 das 27 assinaturas necessárias para dar início aos trabalhos da comissão.


Uma investigação sem limites claros


O requerimento protocolado pela senadora em 15 de outubro de 2025 apresenta como objetivo investigar uma série de supostas práticas abusivas adotadas pelas operadoras de planos de saúde. Entre os pontos destacados estão os cancelamentos unilaterais de contratos durante tratamentos em curso, negativas de cobertura para procedimentos previstos no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), atrasos e recusas de reembolso, além de exigências consideradas desproporcionais ou fraudulentas impostas aos beneficiários.


Outro ponto mencionado é o suposto ônus indevido repassado ao Sistema Único de Saúde (SUS), tanto em volume de atendimentos quanto em valores não ressarcidos pelas operadoras.


O que chama atenção, no entanto, é a amplitude e a generalidade dos fundamentos apresentados para justificar a abertura da CPI. Não há delimitação clara do escopo da investigação, nem apresentação de casos concretos ou dados específicos que justifiquem a necessidade de uma comissão parlamentar com poderes investigativos. A impressão que se tem é que se pretende discutir "tudo" sobre os planos de saúde, uma abordagem que pode comprometer a eficácia e a objetividade dos trabalhos.


Argumentos abstratos para questões concretas


É inegável que a discussão sobre negativas de tratamentos representa um assunto de extrema relevância para milhões de brasileiros que dependem dos planos de saúde. Contudo, a mera existência de negativas, por si só, não constitui elemento suficiente para justificar a abertura de uma CPI.


As negativas de cobertura são previstas em lei e regulamentadas pela ANS, ocorrendo em situações específicas, como procedimentos não incluídos no rol de cobertura obrigatória, não cumprimento de carências ou ausência de indicação técnica. A investigação deveria, portanto, focar em casos específicos de negativas indevidas, com apresentação de dados concretos que evidenciem uma prática sistemática e generalizada, e não apenas em alegações genéricas.


CPIs como instrumentos de pressão política


Um aspecto que merece reflexão é o uso recorrente das CPIs como instrumentos de pressão contra setores econômicos específicos. No caso dos planos de saúde, não seria a primeira vez que o setor enfrenta esse tipo de escrutínio parlamentar.


Nos bastidores de Brasília, é sabido que algumas CPIs funcionam como parte de um jogo político mais amplo, no qual a exposição pública negativa serve como moeda de troca. As empresas investigadas, temerosas dos danos reputacionais e das possíveis consequências regulatórias, muitas vezes se veem compelidas a buscar aproximação ou apoio dos próprios políticos envolvidos na comissão.


Esse modus operandi, infelizmente, não é incomum no cenário político brasileiro. Políticos habilidosos montam o palco da exposição para que as empresas se sintam pressionadas a "desarmar a bomba" – sendo que a solução para o problema frequentemente passa pelos próprios parlamentares que iniciaram o processo.


Entre a fiscalização legítima e o jogo de interesses


É importante ressaltar que o papel fiscalizador do Poder Legislativo é fundamental em uma democracia saudável. As CPIs, quando bem conduzidas e fundamentadas em evidências concretas, podem trazer à luz problemas reais e contribuir para o aperfeiçoamento de políticas públicas e marcos regulatórios.


No entanto, quando utilizadas de forma genérica, sem delimitação clara de escopo e com fundamentação abstrata, correm o risco de se transformar em palcos para discursos populistas ou instrumentos de pressão para interesses que nem sempre coincidem com o bem público.


No caso específico dos planos de saúde, setor já altamente regulado pela ANS, cabe questionar se uma CPI com escopo tão amplo e indefinido seria o instrumento mais adequado para abordar os problemas existentes, ou se outras vias institucionais – como o fortalecimento da própria agência reguladora ou a revisão da legislação setorial – não seriam caminhos mais eficazes.


Conclusão: um questionamento necessário


Diante desse cenário, cabe a cada cidadão refletir: será que esse tipo de CPI, com fundamentos genéricos e escopo ilimitado, realmente faz bem para a sociedade brasileira? Ou estaríamos apenas assistindo a mais um capítulo do teatro político nacional, onde os verdadeiros beneficiários não são necessariamente os usuários dos planos de saúde?


A fiscalização do setor de saúde suplementar é necessária e bem-vinda, mas precisa ser conduzida com seriedade, objetividade e foco em resultados concretos para a população. Do contrário, corremos o risco de testemunhar apenas mais um espetáculo político sem consequências práticas para a melhoria do sistema de saúde brasileiro.


Enquanto a senadora Soraya Thronicke continua sua busca pelas assinaturas necessárias, resta-nos acompanhar com atenção crítica os desdobramentos dessa iniciativa e seus reais motivadores.

 
 
 

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