Bilhões em perdas judiciais
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Especialista questiona por que operadoras negam procedimentos já contratados, enquanto lucros disparam e gastos com ações judiciais triplicam em cinco anos
Vários veículos de comunicação enfatizaram os dados divulgados pela ANS sobre a contabilização das despesas judiciais nos planos de saúde. A maior repercussão foi da UOL, com uma manchete de que as operadoras descumprem os contratos.
Para a SEGS, Elano Figueiredo, fundador do Portal JS comentou o assunto:
Dados recentes da agência reguladora dos planos de saúde no Brasil apontam que as operadoras registraram lucro líquido de R$ 7,1 bilhões no primeiro trimestre de 2025 - um crescimento de 114% em relação ao mesmo período do ano anterior. Em paralelo, as despesas com ações judiciais também aumentaram expressivamente, passando de R$ 1 bilhão em 2020 para quase R$ 4 bilhões no acumulado de 12 meses até março deste ano.
Segundo a própria Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), 62% dessas despesas decorrem de procedimentos que já constam nos contratos firmados com os beneficiários, o que pode evidenciar um cenário preocupante de negação indevida de cobertura.
Diante da repercussão, o advogado Elano Figueiredo, especialista em regulação e ex-diretor da ANS, comenta: “Muitos me perguntam se o aumento dos lucros dos planos estaria associado à negativa de coberturas, mas essa conclusão é precipitada. Isso porque as despesas decorrentes de decisões judiciais - como liminares que obrigam à realização do atendimento - também impactam diretamente o resultado das operadoras e já estão contabilizadas. Em muitos casos, essas condenações são mais onerosas, por envolverem valores de tabela particular e indenizações por dano moral”.
O dado mais preocupante está no fato de que a maioria dos processos judiciais envolve coberturas já previstas em contrato. “Por que, então, esses atendimentos foram negados? A resposta não está no lucro, porque foram deduzidas, então elas estariam sendo corretamente contabilizadas e classificadas?”, questiona Figueiredo.
Aqui, vale realçar um pouco mais a questão da contabilização. O nome da conta contábil em referência é "Despesas judiciais com eventos conhecidos de assistência à saúde", que a ANS está traduzindo no Power-BI como "ações relacionadas a procedimentos previstos nos contratos de planos de saúde". Mas essa definição realmente significa que o tratamento reclamado no processo era de direito do consumidor?
Aprofundando o assunto, a própria ANS determina que "o registro contábil dos eventos/sinistros conhecidos ou avisados deverá ser realizado pelo seu valor integral cobrado pelo prestador no mês em que ocorrer o aviso da realização do atendimento, por qualquer meio, independentemente da existência de qualquer mecanismo, processo ou sistema de intermediação da transmissão, direta ou indiretamente por meio de terceiros, ou da análise preliminar das despesas médicas".
Assim, temos que as operadoras são obrigadas a registrar os atendimentos quando ocorrem, ainda que por força de ordem judicial (por isso chamados de conhecidos ou avisados). Mas muitos deles são custeados por força de liminar - momento em que ainda não há um julgamento definitivo do processo.
Ainda mais, temos um dado do Poder Judiciário de que, entre 10 ações contra planos de saúde, de 8 a 9 são julgadas procedentes. Isso quer dizer que a estatística contábil está até menor do que divulgam tribunais como o de São Paulo.
Então, pode haver um relevante viés na conclusão de que 62% das despesas judiciais decorrem de descumprimento contratual efetivo - tudo por culpa da tradução discutível que o regulador fez da conta contábil.
Aguardemos os próximos capítulos.
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