No setor de planos de saúde, franquia é definida como sendo o valor estabelecido no contrato assistencial, até o qual a operadora não tem responsabilidade de cobertura, quer nos casos de reembolso ou nos casos de pagamento à rede credenciada. Já coparticipação é a parte efetivamente paga pelo consumidor ao plano, referente a uma participação direta que ele terá no custo da realização do procedimento.
Essas definições constam da Resolução CONSU 08, de 1998. É nela em que se regula, até hoje, o assunto, tratado como gerenciamento das ações de saúde ou, também, como fator moderador ou, ainda, como mecanismos financeiros de regulação. São formas de racionalizar o uso da assistência, tornando o consumidor sócio do negócio, que propicia uma mensalidade fixa mais acessível.
Para quem não sabe, o Conselho de Saúde Suplementar – CONSU funcionou diretamente na regulação de saúde enquanto se criava e organizava a ANS. Editou algumas resoluções que foram sendo atualizadas de acordo com o dinamismo e a evolução das necessidades da saúde suplementar. A maioria delas já está revogada.
Já se pode supor, portanto, que a Resolução 08 traz meros conceitos normativos, algo provisório, que tinha o objetivo de ser uma ponte para a regulação definitiva.
Então, passados mais de 25 anos, por que ainda continua vigendo para franquia e coparticipação?
Simples responder: porque o STF proibiu a regulamentação, quando foi editada. Não foi omissão da ANS não.
Isso mesmo. Em julho de 2018, a Agência publicou a RN 433, regulando os mecanismos financeiros e estipulando limites importantes em defesa do consumidor, tais como o percentual máximo a ser cobrado em coparticipação, teto anual e hipóteses em que seria inviável a incidência da cobrança, tal como em tratamentos crônicos, a exemplo da hemodiálise, da quimioterapia e da radioterapia.
Ainda assim, a Ministra Carmen Lúcia suspendeu a resolução, com uma manchete bombástica: “Saúde não é mercadoria. Vida não é negócio. Dignidade não é lucro. Direitos conquistados não podem ser retrocedidos sequer instabilizados”.
Com todo os respeito que um advogado deve ter a um Ministro, preciso indagar: quando é que vão perceber que o agente regulador, aquele que está totalmente dedicado a estudar a saúde suplementar, é quem realmente entende do assunto e consegue indicar o melhor caminho para as relações entre planos de saúde e beneficiários?
Bem, mesmo com um discurso tão bonito, sabem o que a Ministra conseguiu? Ela impôs aos consumidores mais 7 anos de coparticipação sem limites (porque a Resolução CONSU não impõe). Para completar, o paciente de hemodiálise e de oncologia continuam sujeitos à cobrança de participação em seus tratamentos; isso entre várias outras isenções, que constavam do Anexo da resolução proibida pelo STF. Faz sentido?
Então, a respeito desse tema, de regular franquia e coparticipação, estamos há muito tempo atrasados e a ANS vai tentar pela 2ª vez. Para quem deseja entender a realidade que nos espera, recomendo a leitura da RN 433, porque isso simplifica bastante a compreensão.
Além de tudo, clarear o tema franquia é muito importante, para que as operadoras possam disponibilizar aos consumidores opções de produtos mais acessíveis, pelos quais se aceite uma fórmula diferente para mensalidades menores.
Acelera aí, ANS.
Sou Elano Figueiredo, ex-diretor da ANS, especialista em sistemas de saúde e fundador do Portal JS.
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