A Unimed tem solução sim
- elano53
- 3 de mar.
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Artigo de opinião, por Elano Figueiredo.
Independente das tantas notícias de crises que trazemos sobre o sistema Unimed, eu acredito no plano de saúde cooperativo.
Entre tantos desafios de gestão, ninguém poderá negar o poder de capilaridade e penetração das Unimeds, o que lhes empresta uma importância enorme no atendimento médico pelo interior do Brasil. Dr. André Longo quem me abriu os olhos para isso, desde 2012.
Mas os principais desafios do sistema colidem muito fortemente com seus maiores predicados. Passeemos por alguns.
Em primeiro lugar: dizer que o médico é o próprio dono não significa necessariamente algo bom. A uma, porque médico não é reconhecido por ser um excelente gestor ou administrador. A duas, porque com muitos donos, são muitas “mãos” no negócio, gente demais tomando decisão. A três, porque isso gera um sentimento de posse, pelo qual cada cooperado se acha no direito de lucrar mais com a cooperativa. A quatro, porque com esse tanto de donos formando a rede credenciada, fica difícil controlá-la (e esse é o grande segredo do negócio dos planos de saúde hoje: controle dos excessos).
Nesse primeiro ponto, o que acho pior e mais contraditório é que o médico cooperado se diz dono para receber sua produção e tomar as decisões; mas na hora de aportar, quando precisa pôr dinheiro no negócio, contrata um advogado e vai ao Juiz reclamar. Vide Unimed Cuiabá.
Em segundo: o sistema de intercâmbio é algo único, que possibilita amplo atendimento nacional, de uma forma que nenhuma outra operadora oferece. Mas controlar a caneta dos médicos na “Unimed de destino” tem se mostrado impossível. Sem controle, os excessos imperam. E está piorando... Algumas Unimeds têm visto no intercâmbio uma oportunidade de lucrar até mais que a operação corriqueira. Essa visão é preocupante.
Terceiro: dizer que uma Unimed é boa porque autoriza tudo, nos dias de hoje, ainda é uma qualidade?
Em quarto: a dispendiosa qualificação do corpo de funcionários vem se mostrando um investimento sem retorno certo. Eles são “paparicados” e ao invés de render mais estão ficando mal-acostumados, acomodados.
Quinto: os investimentos em rede própria, tendência de salvação no setor, é um dos maiores problemas na Unimed. Tão logo a cooperativa inaugura um hospital próprio, já tem um grupo de especialidade pronto para sugar, enquanto os cooperados mais antigos, já em produção descendente, apresentam-se prontos para ocupar cargos. Como isso pode dar certo? Eficiência passa longe.
Mas tudo isso tem solução, que reclama profissionalização da gestão.
O problema da Unimed não é o seu modelo, mas muitas das pessoas ali dentro hoje.
Poucos são os médicos que assumem um cargo nas cooperativas olhando para a instituição. Todos têm interesses próprios; seja se remunerar, ascender a cargos políticos internos e externos, viabilizar sua clínica, seu hospital ou tender para o seu grupo de especialidade. E o nepotismo é regra dentro do sistema!
Difícil saber de alguém que se candidatou para manter, reerguer ou replanejar a operadora.
Não culpo apenas os diretores. A maioria dos cooperados não têm o sentimento de pertencimento. Estão ali para lucrar. Se a coisa vai bem, ok. Se vai mal: “tchau, não é comigo”.
À medida em que os médicos forem reeducados no que diz respeito ao cooperativismo médico, a coisa pode melhorar. Talvez valha pensar em menos médicos no sistema - mas com a consciência exata do que seja a Unimed: um casamento com alegrias e tristezas também.
Alguns vão vir aqui comentar que é fácil escrever, falar. “Quero ver sentar na cadeira de diretor e mudar”.
É difícil sim e tem que quebrar ovos. Mas a Unimed do Brasil deu um grande passo, há pouco tempo, organizando os direitos de uso da marca. A partir disso, os princípios podem ser montados para o sistema como sistema. Quem deseja continuar usando a marca, terá que se adequar.
E aí, premissas básicas devem prevalecer:
1. O cooperados não podem exercer mais a gestão executiva. O médico deve ter a consciência de que administradores profissionais vão tocar a entidade, com perfil de governança forte. Diretor só terá lugar num Conselho de Administração com poderes limitados e na fiscalização da gestão. As decisões ficam com a assembleia e a execução com os profissionais.
2. Os cooperados entram sabendo das suas responsabilidades. Que vai ganhar, sim, mas pode perder também.
3. Não existe reeleição.
4. Transparência precisa estar acima de tudo, para a assembleia conseguir enxergar e decidir.
5. Acabaria essa “estória” de que cada Unimed é autônoma, de que não se trata de um sistema solidário. A Unimed é uma só e suas representações municipais e regionais, que queiram usar a marca, passam a seguir um padrão nacional mais rígido (sei que hoje já existe um manual, mas não tem força). A autonomia regional diz respeito apenas a entender os regionalismos.
6. Preço do intercâmbio tem que ser único e a câmara de compensação precisa ser completamente integrada, imparcial. A Unimed do interior que não aceitar praticar o preço, então não tem direito a usar a marca. The end.
7. Precificação dos contratos precisa seguir uma política atuarial concentrada, formulada por uma Big Four.
8. A Unimed precisa ter um plano de recuperação das suas singulares ou absorção delas, antes de se tornarem um problema sem solução, como foi a Unimed Salvador, que além de quebrar, ainda arrastou a CNU para o buraco também.
9. Os médicos administradores do passado precisam ser responsabilizados, indenizando pessoalmente a instituição pela má-gestão.
Obviamente não vou conseguir esgotar aqui tantas medidas que são necessárias, mas o intuito é apenas mostrar que dá. São muitas as providências e carecem de implantação urgente.
Também preciso reconhecer que as Unimeds merecem melhor apoio do regulador. Hoje, o que a ANS faz é fechar os olhos, como uma mãe para o filho que não consegue largar as drogas. Tipo, “não posso fazer nada, apenas aceitar”.
A Agência precisa cumprir seu papel e levar essa sua filha para uma clínica de reabilitação, conferindo condições dignas de recuperabilidade. Se continuar apenas torcendo para a implosão, teremos um efeito dominó grave; não só dentro do sistema Unimed, mas passando pelos negócios periféricos desse ecossistema e resvalando em laboratórios, clínicas, prestadores médico-hospitalares, concorrentes e, finalmente, nos tantos consumidores da marca.
Aliás, a ANS deveria cessar todo esse “show da Xuxa” que armou, com inovações regulatórias “a mil” (muitos vão entender), e focar nos dois maiores problemas do setor hoje: (a) capacidade e modelo de fiscalização e (b) recuperação do sistema Unimed.
É isso mesmo, senhoras e senhores. A Unimed ainda tem jeito. Não sei por quanto tempo, mas ainda tem.
Um sistema baseado na política e onde o lucro do sócio é o prejuízo do CNPJ gera um modelo impossível de sobreviver pelo conflito de interesses.
O que tem muitos donos não tem é dono algum. Aí a desgraça tá feita.